segunda-feira, 24 de junho de 2024

Em Assuão...

 

Junto à barragem de Assuão encontram-se tesouros, como Philae e Abu Simbel

Nos anos 60, o governo egípcio decidiu construir uma grande barragem na zona de Assuão, onde já existia uma pequena barragem construída pelos britânicos no século XIX. O Nilo era um rio caprichoso, que aumentava ou diminuía o seu caudal consoante as chuvas que recolhia lá muito para sul, junto das suas nascentes. O rio era a chave da prosperidade egípcia, mas também podia ser o seu carrasco, em anos de seca.

No cais de embarque

Chegada à ilha de Philae

Sempre houve tentativas para domesticar o Nilo. A construção da barragem garantiu esse controlo, a par com um fornecimento de energia elétrica quase ilimitado. E assim nasceu o grande Lago Nasser, como foi batizado pelos egípcios.

O Quiosque de Trajano

E é do meio desse grande lago, equilibrado entre o azul das águas e o azul violento do céu do deserto, que emerge o complexo de templos de Philae. Como uma visão encantada, irreal! A ilha em que repousa é totalmente artificial. Philae afundava-se lentamente, submergida pelas águas do lago, que cresciam alimentadas pela grande barragem. Foi preciso construir uma ilha idêntica à original e transportar para lá, ordenadamente, cada bloco de pedra, cada degrau, cada coluna. Que trabalho extraordinário!

A caminho dos grandes pilones que marcam a entrada do templo

Colunas com a deusa Hathor

Agora, aí está Philae, revigorada e deslumbrante! Este complexo de templos já foi construído em tempos romanos, por isso encontramos lado a lado um templo dedicado a Hathor e outro dedicado a Augusto. Já para não falar do Quiosque de Trajano... Por isso também, podemos apreciar a delicadeza das colunas que conjugam os motivos egícios com a influência clássica. Ou assim me pareceu...

Os belos capitéis da colunata

As asas protetoras de Isis

O templo mais imponente é dedicado à deusa Isis que, segundo o mito, aqui se teria refugiado para reconstruir o corpo do marido, Osíris. As salas e os pátios sucedem-se. Percorremos as colunatas. Descemos os degraus que levam ao lago. Todo o conjunto é belíssimo e harmonioso.

Sucedem-se as cenas simbólicas gravadas na pedra


O Professor Luis Araújo, que nos guia nestas descobertas, leva um saco de ração para alimentar os gatinhos de Philae. Porque há que reverenciar o passado e cuidar do presente...

Os gatinhos da Philae vão apreciar a lembrança

Mas nada consegue preparar-nos para Abu Simbel. Podemos já ter visto imagens e documentários sobre este templo, mas quando ali chegamos e nos deparamos com aquelas figuras esmagadoramente grandes, ficamos tão estarrecidos como um pobre camponês da Núbia, face ao poder evidenciado pelo faraó egípcio!

Abu Simbel ao amanhecer


Chegámos a Abu Simbel de madrugada, quando o sol começa a levantar-se sobre o enorme Lago Nasser. A luz doirada cresce sobre as águas e ilumina as figuras que encaram o lago. Aí está Ramsés II, ladeado pelos três grandes deuses do reino, Amon, Ré Horakti e Ptah. As estátuas são colossais: têm cerca de 22 metros de altura! O que pretenderia Ramsés II com esta representação? Claramente, pretendia afirmar a grandeza do poder egípcio, nessa província tão a sul, tão distante do centro político do império. Mas também é evidente que se quer apresentar como uma divindade de estatuto idêntico ao dos deuses que o acompanham. Temos de lhe perdoar esta fraqueza, tinha pouco mais de quinze anos quando mandou construir este extraordinário templo de Abu Simbel.

Deuses e faraós guardam a entrada do templo



Ramsés II é talvez o faraó mais conhecido das longas dinastias dos vários impérios egípcios. É um faraó singular. Morreu com mais de 90 anos, deixando também mais de 90 filhos e filhas (algumas das quais ocuparam o cargo de “Grande Esposa Real”). Era um grande chefe militar e um grande propagandista. Mandou gravar por todo o reino a sua imagem como grande vencedor da batalha de Kadesh, contra os Hititas, embora ainda hoje se discuta sobre a veracidade dessa vitória. Mas Ramsés sabia que uma imagem vale mais do que 1000 palavras...

Ramsés enquanto faraó vitorioso...

... e os povos núbios subjugados.

Em Abu Simbel, o poder da imagem também é utilizado: a imagem do rei divinizado é repetida até à exaustão.

Hórus, enquanto representação simbólica do faraó

Abu Simbel é o maior templo rupestre do Egipto, avançando por 60 metros dentro da montanha. Engloba duas salas com pilares – estátuas e vai diminuindo através de um corredor com imagens gravadas e pintadas, até uma espécie de gruta, o santuário interior. Aí estão novamente os 4 deuses do templo, entre os quais o próprio Ramsés II, iluminado pelos raios do sol nascente a cada equinócio.

O corredor ladeado de estátuas

O santuário interior

Há um segundo templo mais pequeno, situado a norte, dedicado à rainha Nefertari, aqui equiparada à deusa Hathor.

O templo da rainha Nefertari

Nefertari com a deusa Hathor

Ambos os templos de Abu Simbel foram salvos das águas do Lago Nasser entre 1964 e 1968. Num projeto internacional liderado pela UNESCO, os dois templos foram cortados em blocos e transferidos para um local mais elevado nas margens do lago, salvando-os da destruição. E aí continuam, como símbolos da grandeza do Egipto faraónico, dos sonhos de Ramsés II, e do engenho e capacidade técnica dos homens que, mais de 30 séculos depois, os continuam a olhar com admiração.

Barcos no Lago Nasser

Sem comentários:

Enviar um comentário