domingo, 20 de maio de 2018

Málaga e o Caminito d'El-Rey II



Entrada no Caminito: primeiro patamar do passadiço

O Caminito d'El-Rey é um percurso pedestre, localizado nos Montes de Málaga, a norte da cidade. Mas, acima de tudo, é um local de realização pessoal, ou assim eu o senti.
Sendo um percurso linear, que liga as pequenas albufeiras e centrais hidroelétricas de Ardales e El Chorro, tem duas entradas, norte e sul, ambas com bons acessos e parques de estacionamento. No entanto, só se pode aceder ao Caminito pela entrada norte, em Ardales, o que não constitui qualquer problema para quem chega pelo sul, já que há um autocarro que faz serviço de shuttle entre os dois pontos.

O passadiço segue a levada
O acesso ao Caminito propriamente dito não é muito evidente: não há grandes cartazes ou indicações e é fácil passar pela entrada sem dar por isso. Há um caminho mais longo, sempre pela margem do rio Guadalhorce, e um atalho, por dentro de um túnel que tem um pequeno letreiro indicativo. Esse túnel é longo e escuro, e pareceu-me mais perigoso do que o passadiço pendurado no desfiladeiro.


Saída do reservatório de água do Gaitanejo
O passeio, ao longo do rio, é muito agradável e só perto da central hidroelétrica uma barragem no caminho de terra nos indica que estamos a chegar ao troço mais conhecido e esperado.
Paramos aí. Os nossos bilhetes apontam a hora de entrada, mas temos de esperar por outros caminhantes para que, em pequenos grupos, nos sejam dadas as instruções de segurança: capacetes na cabeça, nada nas mãos. Tudo o que cair do passadiço, lá ficará, é estritamente proibido sair do caminho. Ali, na entrada há umas instalações sanitárias. São de aproveitar, porque no Caminito não se pode comer, nem beber, nem satisfazer qualquer outra necessidade fisiológica.


Pequena ponte no desfiladeiro de El Tajo de las Palomas
A propósito de bilhetes, devem comprar-se online, no site do próprio Caminito d'El-Rey, e é melhor comprá-los com bastante antecedência. Quando entrámos, um nosso compatriota que queria entrar também, teve de voltar para trás. É raro haver bilhetes disponíveis no próprio dia.
A partir daquele ponto, entra-se no passadiço que acompanha a levada de água que atravessa os desfiladeiros de Gaitanejos e de los Gaitanes. Inaugurado pelo rei Afonso XIII, em 1921, o passadiço original destinava-se à deslocação dos trabalhadores entre as duas centrais hidroelétricas. O caminho agarra-se às paredes de rocha, verticais e vertiginosas, dos desfiladeiros.


No desfiladeiro de los Gaitanes

Levada e ponte suspensa no desfiladeiro de los Gaitanes

Não posso deixar de pensar nos trabalhadores que ali passavam, em condições muito menos seguras do que as atuais, assim como nas angústias e desastres que por ali aconteceram e que levaram ao encerramento do caminho, em 2000. De vez em quando, uma placa recorda-nos um desses desastres.


Em memória de três jovens que aqui perderam a vida

No espaço de cerca de um quilómetro entre os dois desfiladeiros, há uma casa com um pequeno prado que hoje serve de heliporto e apoio para os caminhantes. De resto, não há vestígios de pessoas, apenas abutres que sobrevoam as rochas, lá no alto.


Um pequeno vale separa os altos desfiladeiros


Dezenas de abutres sobrevoam as escarpas

Hoje, há por ali alpinistas a desafiar as altas paredes do desfiladeiro. Admiro-lhes a coragem. Escalam aquelas rochas, levantadas e enrugadas ao longo de milhões de anos, como nos recordam os fósseis de amonites que surgem nas paredes, mesmo ao nosso lado.


O comboio assoma dos túneis que furam as rochas enrugadas por milhões de anos


Fóssil de amonite com cerca de 25 cm

Depois da pequena ponte suspensa, que treme com os nossos passos, o caminho é ainda longo, até El Chorro, mas já é fácil. Passamos junto dos túneis ainda hoje percorridos pelo comboio que liga Málaga a El Chorro, olhamos para o desfiladeiro que se ergue, imponente, atrás de nós, e sentimos um orgulho qualquer, uma sensação de realização pessoal: sim, eu fiz o Caminito d'El-Rey!


A saída do desfiladeiro: fim do Caminito

quarta-feira, 9 de maio de 2018

Málaga e o Caminito d'El Rey I

As ruas de Málaga, em redor da catedral

Se alguém pensar que o sul de Espanha só tem sol e praias, está muito enganado e arrisca-se a perder alguns dos locais mais encantadores que a nossa Europa tem para oferecer.
Málaga situa-se no centro da chamada Costa do Sol e, no verão, está a abarrotar de turistas que se perdem entre a praia da Malagueta e os bares, onde as tapas e as cañas ajudam a suportar o calor abrasador. Há muitos bares agradáveis e com decorações tipicamente andaluzas. Um dos mais conhecidos é o El Pimpi, propriedade desse malaguenho bem conhecido, Antonio Banderas!

El Pimpi, o bar mais icónico...

...tão bonito por fora como por dentro!


Provavelmente, é nesta altura da primavera que é mais agradável visitar esta cidade que tem tanta coisa interessante para conhecer. Para começar, Málaga é uma cidade muito antiga. E todos os povos que por lá passaram deixaram as suas marcas. Foi fundada pelos fenícios, que ali vinham buscar sal, mas tornou-se uma cidade importante no tempo dos romanos. A atestá-lo está o teatro romano, coberto de terra até ao início do século XX, mas hoje completamente recuperado. Acima do teatro, é a Alcazaba muçulmana que nos chama a atenção. Imponente, avançava até ao mar mediterrâneo, quase inexpugnável! 

O Teatro romano coroado pela Alcazaba mourisca


Foi necessária muita ousadia e imaginação para a sua captura pelos cristãos, em 1487, e o feito foi comemorado com a construção de uma magnífica catedral, no espaço anteriormente ocupado pela mesquita. Os malaguenhos chamam-lhe carinhosamente La Manquita, já que uma das suas torres nunca chegou a ser construída.

La Manquita

Pormenor do interior esplendoroso da catedral

Há muitos malaguenhos célebres, como o poeta judeu do século XI Ben Gabirol, mas o mais conhecido é, sem dúvida, Pablo Picasso. A sua cidade natal dedicou-lhe um museu, muito interessante, que segue a sua obra desde os primeiros desenhos até às últimas fases, mais experimentais. Embora não se encontrem aí as obras mais emblemáticas de Picasso, é um museu que vale a pena visitar. Junto à casa onde nasceu, há uma estátua de Picasso, sentado num banco de jardim. Dizem os malaguenhos que os turistas mais distraídos lhe tiram  fotografias pensando tratar-se de Bruce Willis!


Uma visita de estudo no Museu Picasso

Eu e o Bruce Willis... perdão, Picasso!


Será influência de Picasso? A verdade é que a cidade tem uma boa oferta de arte moderna, desde o Thyssen até ao Pompidou-Málaga, junto ao passeio marítimo.

O Passeio Marítimo

O Centro Pompidou-Málaga

Málaga é uma cidade vibrante e agradável, mas os pontos mais fascinantes estão escondidos nos montes que a rodeiam, a norte. Aí, são as formações rochosas que são protagonistas de cenários fantásticos! E os pequenos povoados empoleiram-se no topo dos montes ou escondem-se nos recessos das rochas. São os pueblos blancos, e vale a pena partir à sua descoberta!



Um desses pueblos é Setenil de las Bodegas. Cresceu entalado entre um pequeno rio e as altas paredes de rocha que lhe servem de margens. As casas conquistaram o seu espaço à própria rocha e aninharam-se à sua sombra. E agora passeamos sob um céu de pedra.

Setenil de las Bodegas

A Cueva de la Sombra...

... e a Cueva del Sol

Almoçamos no Bar-Restaurante Dominguez, que entra neste relato de pleno direito pelos belos petiscos que por lá descobrimos. Em especial, o queijo de cabra frito com confitura de ananás, de comer e chorar por mais...

Petiscar à sombra das laranjeiras

O local mais fantástico e icónico, no entanto, fica nos desfiladeiros que bordejam as albufeiras de El Chorro. É o Caminito d'El Rey e merece um post que lhe seja inteiramente dedicado: o próximo post.