domingo, 10 de novembro de 2013

A Basílica Real de Castro Verde

No meio do Alentejo, há um monumento extraordinário que não chama a atenção dos milhares de turistas que passam ali tão perto, a caminho das praias do Algarve ou no seu regresso: a Basílica Real de Castro Verde.
Foi mandada construir por D. João V, no século XVIII, no lugar onde já se erguia outra igreja mais pequena, mandada erigir por D. Sebastião. O objetivo era homenagear D. Afonso Henriques perto do local onde decorreu a batalha de Ourique e, ao mesmo tempo, dedicar o templo à padroeira de Portugal, Nossa Senhora da Conceição. 

 (No exterior da Basílica, esta escultura celebra a vitória de Ourique)

Construída em plena euforia dos ouros brasileiros, a basílica tem uns belíssimos altares em talha dourada. Mas são sobretudo os azulejos que nos tiram a respiração. As paredes são integralmente forradas a azulejo, ostentando um conjunto de painéis que recordam os episódios do milagre de Ourique. Na verdade, quer se acredite ou não na veracidade da aparição da cruz de Cristo, o facto é que o caso, tal como foi divulgado, fez milagres na afirmação da nacionalidade portuguesa junto da Santa Sé. Sempre merece, por isso, ser celebrado.
Os tetos de madeira pintada são também de uma beleza e delicadeza extraordináras. Infelizmente, tanto as pinturas como os azulejos estão a precisar de alguns trabalhos de manutenção, para os quais não há dinheiro disponível. Não existem ainda grandes danos, são coisas que, se calhar, passam despercebidas aos olhos mais desatentos; mas existem e, se não forem tratados, agravam-se até se tornarem problemas insolúveis.

(O belo interior da Basílica)

Escondida no meio do Alentejo, sem a notoriedade e a espetacularidade da vizinha Mértola, Castro Verde merecia mais reconhecimento. É uma vila encantadora, bem preservada, com muitos motivos de interesse, desde o Museu da Lucerna, que recupera os vestígios e a presença romana na região, até às suas casas, herdeiras da melhor tradição da arquitetura regional alentejana.
Castro Verde merece uma visita, nem que seja apenas pela Basílica Real. E a Basílica Real merece a sua restauração, para deleite de todos nós. A bem da preservação do nosso património histórico.

(Texto e fotografias de Teresa Diniz)

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

O Manneken Pis

Tenho ouvido várias vezes a pergunta, quase escandalizada de tão surpreendida: "O quê? Bruxelas é uma cidade tão antiga e tão rica e o seu símbolo é um miúdo a fazer xi-xi? Uma estatuazinha numa esquina, que não chega a medir um metro de altura?"

(O Manneken Pis... uma réplica, claro!)

Tudo tem a sua razão de ser. Conta a tradição (uma delas, porque há muitas versões!) que um rico burguês da cidade teria perdido o seu filho durante uns dias de festa, encontrando-o ao fim de cinco dias, naquela mesma esquina, a fazer o que o MannekenPis faz ainda hoje. O pai, reconhecido, teria mandado fazer aquele pequeno memorial! 
Ao certo, sabemos que a pequena estátua foi obra de Duquesnoy e data de 1648. Dali, jorrava água nos dias normais, e vinho em dias de festa! Hoje, nem água potável dali sai. No entanto, continua a ser acarinhada pelos habitantes da cidade e ponto de passagem obrigatório para os turistas.
Por duas vezes, a imagem do rapazinho nú foi roubada e depois devolvida aos bruxelenses. Da primeira vez, foram os ingleses os autores do roubo; da segunda vez, foram os franceses, no reinado de Luis XV. Terá sido este rei quem, para acalmar os habitantes de Bruxelas, condecorou o rapazinho com a cruz de São Miguel, conferindo-lhe um grau de nobreza e um fato de cavaleiro. Inaugurou uma tradição que se mantém até hoje, de vestir o Manneken Pis com as indumentárias mais variadas, que vão do fato de combatente de 1830 até ao fato de estudante da Universidade de Bruxelas. Também tem recebido fatos tradicionais de muitos países à volta do mundo: tem fatos de samurai, de toureiro, de astronauta... O seu guarda-roupa é invejável e pode ser visto no Museu da Cidade de Bruxelas.

(O fato de cavaleiro - a primeira indumentária)

O pequeno Manneken Pis vai exibindo as suas variadas vestes nas festas da cidade. Mas é na sua nudez e inocência que ele se assume como símbolo dos seus habitantes. Assim o afirma uma antiga quadra popular:


          Ma nudité n'a rien de dangereux,
          Sans péril, regardez-moi faire;
          Je suis ici comme l'enfant heureux
          Qui fait pipi sur le sein de sa mère...


sábado, 28 de setembro de 2013

Grand' Place, a praça mais bela da Europa


(Sábado de manhã na Grand' Place)

Bruxelas deve ser a cidade da Europa de que mais se ouve falar. Regularmente, somos informados de que os nossos governantes se deslocaram a Bruxelas para discutir e decidir sobre os mais variados assuntos. Os técnicos dos diferentes ministérios passam a vida em reuniões promovidas pela Comissão Europeia, e os aeroportos e os hotéis estão cheios destes burocratas, de fato e pasta na mão.
E, no entanto, Bruxelas é muito mais do que isso. Não é só a capital da Europa, é uma capital europeia com muito para mostrar, dos chocolates às galerias de arte, da banda desenhada ao recente Museu Magritte.
No centro da cidade, o ponto para o qual tudo converge é a Grand' Place. É apontada como sendo a mais bela praça da Europa. Não sei se é. Lembro-me de outras praças igualmente belas, cada uma ao seu estilo. Mas que é maravilhosa, na beleza e harmonia dos edifícios que a rodeiam, lá isso é verdade!

(A torre da Maison de Ville)

O edifício mais importante é a "Maison de Ville", que data do século XV. o interior merece uma visita e aí se celebram hoje muitos casamentos. A torre, alta mas graciosa no seu rendilhado, eleva-se a 114 metros e, no topo, uma estátua em bronze dourado do arcanjo S. Miguel aponta a direção do vento. Era neste edifício que se reuniam os burgueses, os homens comuns da cidade, para determinarem os seus assuntos, e é um símbolo das liberdades comunais.

 (Na varanda da Maison de Ville)


Em frente, do outro lado da praça, ergue-se a Maison du Roi. Começou por ser a Broodhuys, ou Casa do Pão, já que aí se garantiam os direitos do fabrico e comercialização do pão. Reedificada por Carlos V, várias vezes danificada e reconstruída, acabará por ser comprada pela cidade e remodelada até ter o aspeto que hoje apresenta. Alberga o Museu da Cidade de Bruxelas.

(A Maison du Roi vista da Maison de Ville)

A toda a volta da praça, as Casas das Corporações, dos padeiros aos tecelões, dos barqueiros aos cervejeiros, rivalizam em beleza e riqueza ornamental. Cada uma merece um olhar atento, mas é o conjunto que atrai a atenção. No seu conjunto, elas formam mais do que uma praça; estas casas mostram o poder dos ofícios no governo da cidade, o apreço pelo trabalho e pela criação de riqueza que o trabalho possibilita, pelo esforço dos indivíduos posto ao serviço de uma causa comum. Talvez isso explique algumas coisas...
Aconselho a qualquer pessoa a entrada num dos bares que rodeiam a praça. Pode ser "Le Roi d' Espagne". Sentada à janela, mesmo que chova ou faça frio, a olhar para o espaço que me cerca, não duvido: se não é a praça mais bela, anda lá perto!

(Tarde de chuva na Grand' Place)

Ainda a propósito de cervejeiros, apanhei um fim-de-semana em que decorria na Grand' Place um festival de cerveja belga. Como se sabe, a Bélgica é uma grande produtora (e consumidora...) de cerveja, e são dezenas as marcas e tipos de cerveja diferentes que se podem encontrar. Centenas de pessoas, principalmente jovens, afadigavam-se para experimentar as ditas cervejas e acabavam por se aliviar ali mesmo, a uma qualquer esquina! Pareceu-me uma grande falta de respeito por um espaço tão bonito e tão cheio de pergaminhos! Ou talvez seja apenas a influência do ícone da cidade, o irreverente Manneken Pis! Mas isso já é outra história!

(Textos e Fotografias de Teresa Diniz)