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A pitoresca cidade de Vannes |
Acho que foi nesta praça de Vannes que me apaixonei pela Bretanha. Vannes fica no Golfo de Morbihan, quase uma porta de entrada na Bretanha, e nós vinhamos a apanhar chuva desde Nantes. E não era uma chuvinha qualquer, era uma daquelas cortinas de chuva forte que tira a graça a qualquer paisagem. Das paragens previstas, só tinhamos cumprido a de St. Nazaire, porque queríamos tomar um café. O Tintim acenava-nos, sorridente, dos cartazes: "Allons à St. Nazaire!" mas a chuva tornava tudo pouco convidativo e a cidade parecia deserta. O café onde parámos, junto ao porto, tinha o ar de lá estar desde o tempo de Hergé, assim como o velho empregado de bigode farfalhudo que falava mais bretão do que francês. Havia um cão simpático e um papagaio barulhento, e as paredes estavam cobertas de fotografias de pescarias, veleiros e cartazes brejeiros...
Rumamos, portanto, a Vannes. Comemos os primeiros crepes bretões enquanto a chuva parava e o céu começava a desanuviar. E, quando entrei nesta pequena praça, percebi que estava a entrar num espaço diferente. As casas de cores quentes, com as traves de madeira à mostra, rodeavam um espaço quase quadrado, com algumas esplanadas. A igreja espreitava a uma esquina e quatro jovens tocavam música bretã, de ressonâncias célticas.
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Jovens tocavam junto à praça... |
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Flores, sempre... (em Vannes) |
Depois, à medida que os dias foram passando, percebi que era isso a Bretanha, esse equilíbrio entre uma natureza bela e dramática, uma presença humana colorida mas granítica e uma referência céltica repleta de misticismo.
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Pintando velhos barcos... |
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Casas tradicionais em Dol de Bretagne |
Os mistérios e as lendas rodeiam-nos. Junto a Carnac, situam-se os alinhamentos de menires mais conhecidos da Europa. Por muitas fotografias que tenhamos visto, espantam-nos pela sua incrível extensão e pela desconhecimento: porque foram ali colocadas aquelas pedras, rigorosamente alinhadas? Quem as levantou? Que pensamento religioso esteve na base deste enorme esforço coletivo? Imagino oferendas, sacrifícios e procissões, talvez também cálculos astronómicos. Encontram-se outros dólmenes e menires por toda a Bretanha, mas os de Carnac são os maiores e mais espantosos!
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Os misteriosos alinhamentos de Carnac |
Os mistérios continuam... Passamos na floresta de Broceliande, no Parque Nacional de Armorica. Ali se desenrolaram partes do ciclo de lendas do rei Artur e quase esperamos ver princesas e magos por entre as grandes árvores de troncos cobertos de musgo. Há histórias e lendas na terra e nos rochedos que avançam para o mar, como cidadelas.
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Castell Dinn - Segundo a lenda, foi aqui que os Gigantes Naufragadores foram vencidos pelos Korrigans |
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O Cabo de Penn' Hir |
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Memorial da Batalha do Atlântico, em Penn' Hir |
A própria religiosidade bretã tem um cunho próprio. Há um número enorme de santos, muito venerados, que não foram nunca aceites pela Igreja Católica. Muitos estão reunidos no Vale dos Santos; outros, como São Thegonnec, presidem a igrejas que são Património da Humanidade pelos seus peculiares átrios paroquiais.
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A igreja de São Thegonnec |
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São Thegonnec, o próprio! |
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As imagens, em tamanho real, da cripta do Ossário de São Thegonnec |
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Figuras do extraordinário Calvário de São Thegonnec |
Aqui, após a passagem por um Arco Triunfal que é quase um portal que separa o espaço profano do espaço sagrado, encontram-se os Calvários, com as suas figuras esculpidas, quase ingénuas, quase alegóricas. É nestes átrios paroquiais que ainda hoje se celebram alguns momentos das festividades religiosas bretãs, como tivemos a sorte de presenciar.
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Entrada no Átrio Paroquial de Sizun |
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Preparando a procissão de domingo, em Sainte-Marie
de Menez-Hom (fotografia da minha companheira de viagem Rosa Martins) |
Mas nem só de misticismo se faz a vida. A alegria e o colorido das flores temperam a rudeza da costa e do mar. E a vida não era fácil!...
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As flores enchem de cor as velhas casas medievais (Dol de Bretagne) |
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O porto de Le Cammeret |
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O interior da igreja de Nossa Senhora de Rocamadour lembra o mar e os marinheiros |
Um dos locais onde ficámos alojados foi uma bela casa senhorial, com origens no século XIII, hoje transformada num agradável turismo de habitação, o Manoir de la Grande Mettrie. Recomendo-o vivamente, em especial pela simpatia dos donos, que nos ajudaram como puderam nas peripécias que rodearam uma das nossas motas. Contou-nos o Pierre, o dono do Manoir, que, no tempo da sua avó bretã, havia letreiros nas repartições públicas onde se lia: "Não se pode cuspir no chão nem falar bretão." Este humilhante esforço de normalização não conseguiu porém asfixiar a cultura bretã. E se hoje já não há movimentos independentistas, continua a haver uma forte diferenciação cultural, que floresce com um renovado vigor.
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O Manoir de la Grande Mettrie |
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Flores nas pontes em Quimper |
Essa cultura, essa especificidade bretã, está patente em toda a parte, desde a língua até aos símbolos célticos que adornam as loiças tradicionais e às músicas e danças que tão bem deixam transparecer essa herança céltica.
A Bretanha é muito mais do que um espaço turístico, é um mundo diversificado e fascinante, ao qual eu pretendo voltar. Ficou tanta coisa por explorar!
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Sítios onde apetece entrar... (em Dol de Bretagne) |
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Sítios de onde não apetece sair... (em Quimper) |
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