domingo, 18 de setembro de 2022

As cidades hanseáticas do norte da Alemanha

 

Praça Central de Lübeck

A Liga Hanseática, também denominada Hansa Teutónica, foi uma aliança económica entre cidades mercantis do norte da Europa, entre o Mar do Norte e o mar Báltico. Era uma associação livre e com grande autonomia política. Foi fundada em meados do século XII, na cidade de Lübeck, a que se juntaram outras cidades do norte da atual Alemanha, como Hamburgo, Flensburg, Bremen, Wismar, Rostock, Stralsund. 

O porto de Flensburg

Velhas ruas descem para o porto de Flensburgo

A Hansa era poderosa e criou uma rede de cidades com contrato de associação, que ia de Londres a Bergen na Noruega, ou Novgorod, na Rússia. No século XVII, os interesses políticos levaram ao seu enfraquecimento, sendo estas cidades livres integradas nos estados europeus. O que restou desse poderio comercial, dessa prosperidade? Sempre tive vontade de visitar algumas dessas cidades hanseáticas e procurar as marcas desse tempo histórico. Calhou este ano...

A Guilda dos Navegantes em Lübeck

Réplica de um kogge, um barco mercantil da Liga Hanseática, no porto de Kiel

Dessa rede de cidades mercantis, a mais importante é hoje Hamburgo, que ainda se qualifica a si mesma como “cidade hanseática”. Mas foi em Lübeck que tudo começou e é talvez a cidade onde as marcas dessa época de ouro se mantiveram mais vivas.

O rio Trave

O centro histórico de Lübeck

Lübeck surgiu numa ilha, rodeada pelo rio Trave, o que, sem dúvida, lhe dava vantagens em termos de comércio e de defesa. O centro histórico, a Altstadt, é quase totalmente pedonal e podemos perder-nos nas suas ruelas estreitas, rodeadas de velhas casas de tijolo vermelho, num ambiente que manteve um cunho medieval. Foi esse ambiente medieval bem preservado que levou Lübeck a ser a primeira cidade do norte da Europa a entrar na lista do Património Mundial da UNESCO, em 1987.

Uma das portas de entrada 

Detalhes dos edifícios de tijolo

Junto à porta de entrada na cidade

O símbolo da cidade é a Holstentor, do século XV. É a mais importante das portas de entrada na cidade e a mais conhecida. É bela e imponente, mas as outras portas não lhe ficam muito atrás... Hoje, já não recebe os comerciantes que chegam pelo rio, mas essas histórias ainda estão presentes no Museu Holstentor, que fica nas suas torres.

A bela Porta de Holstentor

Outra perspetiva da Porta de Holstentor

A memória histórica mistura-se com a pujança económica e cultural, que subsiste até aos dias de hoje. Os velhos armazéns comerciais ainda bordejam o rio, alternando com esplanadas. 

Os armazéns hanseáticos nas margens do rio Trave

A Câmara Municipal é a mais antiga da Alemanha e eu diria que das mais bonitas, encastoada como uma jóia entre os velhos edifícios da praça principal. O Hospital do Espírito Santo funcionou ininterruptamente desde o século XIII até aos anos 60 do século XX, sempre dirigido e financiado pela cidade.

Uma das belas janelas da Câmara Municipal

A fachada do Hospital do Espírito Santo

Mas a cultura acompanhou sempre o poder económico. Ali nasceu e viveu Thomas Mann, mas também Gunther Grass e Willy Brandt. A cultura popular e erudita cruzam-se: a tradição das Marionetas mantém-se no Museu da Marioneta e ainda hoje se representam clássicos num teatro de marionetas!

O Teatro de Marionetas, representado num carro que replica as velhas carroças

Deixamos Lübeck e a sua paisagem urbana marcada pelas torres esguias das igrejas: St. Marien, St. Petri, St. Jacobi. No nosso hotel encontramos um jovem casal de motociclistas. Vêm de Itália, dirigem-se ao Cabo Norte com o objetivo de aí preparar e beber um café Moka. Desejamos uns aos outros boa viagem. Nós continuamos à descoberta de outras cidades da Liga Hanseática.

O porto velho de Wismar

Continuamos para leste, na direção de Wismar. Sem nos apercebermos, cruzamos uma linha invisível, a antiga fronteira entre a República Federal da Alemanha e a República Democrática Alemã, entre o sistema capitalista e o sistema comunista, que aqui vigorou entre o final da 2.ª Guerra Mundial e 1990, data da reunificação alemã, após a queda do muro de Berlim. Era a “cortina de ferro”, a separação e o confronto entre dois mundos e duas conceções de vida.

Antigos palacetes relembram a época de prosperidade de Wismar


Depois do dinamismo de Lübeck, deteta-se aqui alguma estagnação, que os habitantes tentam ultrapassar. Wismar parece uma cidade que ficou parada no tempo. Bombardeada na guerra, cinzenta e arruinada, foi reconstruída e reabilitada após a reunificação alemã, com o patrocínio da UNESCO. A torre da igreja de Sta. Maria é bem a imagem dessa destruição: ergue-se solitária, o resto da igreja foi destruído e está agora patente através da delimitação da enorme área da igreja. 

O que restou da igreja de Sta. Maria


Uma rua no centro de Wismar

O centro é muito interessante, com quarteirões inteiros de prédios com os seus telhados e frontarias tipicamente hanseáticos. A praça principal ostenta uma bela fonte, encomendada aos holandeses no século XVII, símbolo da sua prosperidade perdida.

O fontanário do século XVII

A água da fonte jorrava por estas figuras híbridas

Jantámos nessa praça, no restaurante Reuterhaus, de decoração formal e antiquada. Podíamos ali filmar um filme de época, passado nos anos 30 ou 40 do século passado. A comida, no entanto, era excelente. A principal dificuldade foi comunicar com as empregadas, que não falavam inglês, mas eram esforçadas e desejosas de agradar e deixar uma boa impressão da sua cidade que, como dizia uma delas, tinha uma “deep story”! No nosso hotel, o mesmo ar de luxo demodé mas ainda digno. Mas no velho porto, há muita vida, entre barcos de recreio, daqueles onde se pode embarcar para dar uma volta pela zona ribeirinha, e barcos de pesca, alguns dos quais, já atracados, vendem peixe preparado e cozinhado, como os típicos “Fischbrötchen”.

Os barcos de venda de fischbrötchen

Rumamos a Rostock, a terceira cidade hanseática que tinhamos no nosso roteiro. Rostock é uma cidade animada, que se desenvolveu graças à proximidade das praias, algumas delas grandes estancias balneares, como Warnemünde. O porto, onde chegam e partem ferryboats para toda a Escandinávia, garante a passagem de muita gente variada e o desenvolvimento económico. Também nós, amanhã, daí partiremos para a Dinamarca. Mas Rostock também guarda marcas da vida hanseática, particularmente as suas belas portas, guardadas pelos grifos que são o símbolo da cidade.

A porta da cidade de Rostock

Perspetiva interior da porta de entrada

Almoçámos no centro da cidade, junto da Brunnen der Lebensfreude ou Fonte da Alegria de Viver. Que nome tão bem posto! As estátuas que ornamentam a fonte mostram situações de bem-estar e alegria e as crianças que brincavam e se refrescavam nos repuxos eram a demonstração prática dessa alegria de viver! Que boa disposição para despedida das cidades hanseáticas!

A Fonte da Alegria de Viver

Faltam umas palavras sobre Hamburgo, a rainha das cidades hanseáticas, mas receio que essas palavras sejam demasiado extensas. É melhor deixar Hamburgo para outro post.

O grifo, símbolo de Rostock



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