domingo, 9 de abril de 2023

Reviver o passado em Pompeia

O velho fórum de Pompeia

Pompeia era uma cidade de média dimensão, situada no sul da Itália, que beneficiava da pujança comercial do Império. Aninhada aos pés do Vesúvio, numa região muito fértil, era uma pequena cidade próspera e movimentada, conhecida pela sua escola de gladiadores. Provavelmente hoje não reconheceríamos o seu nome, se uma catástrofe terrível não a tivesse destruído totalmente e congelado no tempo.

Um fontanário

No ano de 79 d.C. o vulcão entrou em erupção e soterrou a cidade. Toneladas de cinza vulcânica escaldante caíram sobre a cidade e os habitantes que não conseguiram fugir ficaram soterrados também. O mesmo aconteceu com outros povoados nos arredores, como a pequena cidade de Ercolano. Lava e cinza cobriram a região e silenciaram aquela cidade vibrante e animada. Durante séculos...

Uma rua: os passeios, o fontanário, os sulcos das carroças...

No século XIX, a nascente paixão da arqueologia levou às primeiras escavações de Pompeia. A pouco e pouco, foi surgindo uma cidade romana, tão viva e bem conservada como se tivesse adormecido ontem. Ou como se fossemos nós a regressar ao passado numa qualquer máquina do tempo.

Uma loja de comida pronta a comer

Uma padaria

As cidades são entidades dinâmicas. Crescem, modificam-se. Sucedem-se as guerras, os terramotos, os incêndios. Há construção, depois destruição, e novamente reconstrução, numa cadeia imparável. As mentalidades e as modas mudam. As velhas pedras são reutilizadas com novos propósitos. E o tempo vai esculpindo as cidades, acrescentando camadas de histórias novas a cada século que passa.

Restos de uma domus

Nada disso aconteceu em Pompeia. Ali, o tempo parou no dia da erupção do Vesúvio. E agora, o que vemos é uma cidade romana em plena atividade. As ruas, com o seu velho empedrado, são rodeadas de lojas que conseguimos identificar. Há o tintureiro e a lavandaria. Há padarias, lojas de produtos frescos e lojas de comida já feita e pronta a comer. Há uma associação comercial, bem identificada pelos deuses propiciadores na fachada. Há anúncios e grafitis nas paredes.

Palavras escritas nas paredes há 2000 anos atrás

Os frescos sobre a porta da Associação Comercial

Há casas de habitação, evidentemente. Muitas são pequenos prédios, as insulae, mas também há belas domus, com as paredes pintadas com frescos e o chão coberto de mosaicos. Vislumbram-se os pátios interiores, as salas, as fontes, e conseguimos bem imaginar como ali se vivia.

Interior de uma domus...

... com o seu cão de guarda à entrada.

Muitos dos frescos, esculturas e mosaicos encontrados em Pompeia estão hoje preservados no Museu Arqueológico de Nápoles. É uma visita obrigatória, já que permite completar a visão que a visita à cidade nos proporciona.

Frescos, colunas e composições em mosaico, estão guardadas no
Museu Arqueológico de Nápoles




Um dos espaços mais surpreendentes é o lupanar, a casa de prostituição, bem identificada pelos falos e pelas pinturas que sugerem as diversas posições sexuais que ali se podiam praticar. De resto, os falos aparecem por toda a parte, já que eram considerados símbolos de fecundidade e talismãs de sucesso. Apesar de estarmos no século XXI, a nossa mente reage com surpresa e estupefacção. Os séculos de repressão sexual pesam sobre nós. Mas os romanos não eram assim, para eles o sexo era um ato natural praticado com bastante liberdade e sem discriminações de género.

O falo como amuleto

Pinturas com cenas de sexo explícito nas paredes do prostíbulo

No cruzamento das ruas principais, como em todas as cidades romanas, abre-se o Forum, uma praça larga, rodeada por colunas, onde se situavam os edifícios públicos mais importantes, como os templos e a basílica. Hoje em dia, a estátua de um centauro preside à praça, mas desconfio que no ano de 79 aquele pedestal estaria ocupado pela estátua de um deus. Ou de um imperador, o que era quase a mesma coisa.

No meio do forum, a estátua de um centauro

O que resta do forum, com o Vesúvio ao fundo

Os banhos, as termas, estão por perto. As salas para banhos com águas a várias temperaturas sucedem-se e ainda conseguimos ver as canalizações.

O teto da sala de entrada das termas

Sendo Pompeia uma cidade com tradição nas lutas de gladiadores, possui um anfiteatro bastante grande e bem conservado. Conseguem distinguir-se os vários níveis de bancadas e imaginar um dia de jogos, com as bancadas cheias de público (tinha capacidade para 20 000 espetadores) que gritavam e incentivavam os lutadores.

O anfiteatro de Pompeia

Entrando na arena...

Os espaços das bancadas: ainda se conseguem ver os bancos numerados

Em frente, veem-se os muros da palestra ou ginásio, onde se exercitavam.

Frente ao anfiteatro, o espaço do ginásio

Na mesma praça, erguia-se um hotel, a Praedia de Giulia Felice , para albergar os que vinham assistir aos Jogos. Ainda lá estão os quartos e as salas, os pátios e jardins. Podemos imaginar-nos a passear pelo pátio, rodeando o impluvium, o tanque central que guardava as águas da chuva. Ou podemos imaginar-nos a tomar uma refeição reqintada no triclinium, a sala das refeições, com uma parede ocupada pelos degraus por onde caía a água, em jogos decorativos. Ou podemos simplesmente maravilhar-nos com os frescos, que ainda guardam cores intensas e imagens vívidas.

As salas da Praedia de Giulia Felice

O triclinium, a sala das refeições

Caminhamos por ruas e becos, observamos as lojas e as casas, vemos como estes romanos viviam. Apesar de ainda haver muitos espaços que não foram escavados e explorados, percebemos bem que era uma cidade próspera e vibrante, com muita gente que por ali caminhava, comprava e vendia, entrava e saía daquelas casas. Até um dia... Quando Pompeia foi soterrada pelas cinzas do Vesúvio, alguns não conseguiram escapar. Os seus corpos já desapareceram, mas os espaços que ocupavam na camada vulcânica foram injetados com gesso e hoje sobram-nos os moldes dos seus corpos abatidos pelas cinzas tóxicas. Esses moldes trazem para a vida os antigos habitantes de Pompeia e preenchem as ruas e as casas. Pelo menos, na minha imaginação.

Os moldes dos habitantes mortos de Pompeia

Para nós, que por ali vagueamos, as sensações misturam-se e são estranhas. É como se abrissemos uma brecha no tempo e conseguissemos espreitar lá muito para trás, para um tempo e um modo de vida que já passou há muitos séculos. E que, estranhamente, nos parece muito moderno.



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