sexta-feira, 5 de novembro de 2021

A Samarcanda de Tamerlão

 

A majestosa Praça Registan

O esplendor de Samarcanda atinge um ponto máximo no reinado de Tamerlão, ou Timur, durante a segunda metade do século XIV. Nascido numa época em que os territórios mongóis se tinham fracionado numa série de pequenos reinos que guerreavam entre si, Tamerlão constrói um enorme império, que se estende da Ásia Menor à Rússia e à Índia, passando pela Pérsia. A sua capital é Samarcanda, para onde ele faz transportar as imensas riquezas provenientes das regiões conquistadas. O resultado é um conjunto monumental de uma beleza, originalidade e riqueza sem par.

Um pequeno mausoléu, em Shaki Zinda



Cúpulas

Podemos começar a descobrir a Samarcanda Timúrida na Mesquita Bibi-Khanum, que já mencionei aqui. Foi mandada construir pela primeira esposa de Tamerlão, uma princesa chinesa de grande beleza, a propósito da qual se criaram muitas lendas. A mesquita era, no seu tempo, uma das maiores e mais importantes da Ásia Central.

Vista geral do mausoléu de Tamerlão

Mas Tamerlão dedicava tanto esforço e determinação às suas conquistas como ao embelezamento da sua cidade. E surgiu o complexo arquitetónico de Shaki-Zinda!

O pórtico de entrada em Shaki Zinda

A entrada de um mausoléu

É um conjunto de onze mausoléus, mandados construir por Tamerlão para servir de local de sepultura de algumas das suas mulheres e chefes militares. Organizam-se ao longo de uma rua, à qual se ascende por um pórtico, como o de uma mesquita ou madrassa, seguido de uma escadaria.

Uma rua rodeada de magníficos mausoléus

O interior de um mausoléu

O coração do complexo é o mausoléu de Kusam ibn Abbas, primo do profeta Maomé que, segundo as crónicas, terá chegado a Samarcanda, para pregar a nova fé, em 676. O mausoléu é composto por várias salas e aí se entra através da Porta do Paraíso.

A porta do Paraíso

Cúpula interior do túmulo de Kusam ibn Abbas

O seu túmulo ainda hoje atrai peregrinações. Assistimos a uma, apenas de mulheres.

Uma peregrinação no feminino

Tamerlão desenvolveu o complexo de sepulcros, mandando aí construir diversos mausoléus, que nos rodeiam naquele corredor estreito. Tanto os interiores como os exteriores são de uma beleza e delicadeza extraordinárias, conjugando o que de melhor se fazia no trabalho em cerâmica da época. Os painéis de azulejo sucedem-se em padrões delicados e variados, com motivos em alto-relevo, outros com aplicações em faiança, sempre explorando os mil matizes do lápis-lazuli. Estamos mergulhados em azul...

Mergulhados em azul...

O complexo de Shaki-Zinda foi dos locais mais deslumbrantes onde já estive. Os nossos sentidos deixam-se inebriar pelos padrões azuis que nos rodeiam, tornando até difícil encontrar palavras que descrevam a magia do lugar.

Sucedem-se os padrões de cerâmica

Tamerlão, evidentemente, teria de construir para si próprio um mausoléu ainda maior e mais espetacular. É o mausoléu Guri Emir, projetado por ele próprio, e que acabou por servir de inspiração a outros mausoléus mongóis, como o Taj Mahal.

O mausoléu de Tamerlão


Se o exterior é imponente, é o interior que é impressionante. O seu túmulo é um enorme bloco de jade verde, o maior do mundo, e a sala onde repousa é toda trabalhada em padrões minuciosos e recamada a ouro. Parece que há uma maldição para quem tentar roubar o túmulo! E parece que já funcionou! Junto de Tamerlão, estão os túmulos de outros membros da sua família, como o do seu neto Ulugh-Bek, sobre o qual já aqui escrevi.




O impressionante interior do mausoléu de Tamerlão

Este astrónomo e matemático foi o responsável pela construção da madrassa Ulugh-Bek, na praça central da cidade, que ele queria converter num centro inteletual da Ásia Central. Aí se ensinou o que de mais avançado produzia a ciência de então.

Álea lateral da Praça Registan

A praça central de Samarcanda, a Praça Registan, cresceu e organizou-se a partir dessa madrassa. É o coração da cidade e, ao mesmo tempo, uma jóia preciosa. Rodeiam a praça três madrassas majestosas, definindo um espaço de grande equilíbrio e beleza, que eu quase poderia apelidar de cinematográfico.

A Praça Registan

A madrassa Ulugh-Bek foi, como já disse, a primeira a ser construída. Devia ser um grande centro intelectual, por isso o interior tem um grande número de celas para os estudantes pernoitarem e salas de aprendizagem. No topo da fachada, os padrões de estrelas de dez pontas simbolizam o céu e a astrologia, dando pistas sobre o fundamento dos estudos que aí se concentravam.

A madrassa Ulugh Bek, com as estrelas na fachada

As antigas celas estão transformadas em lojas

No lado oposto da praça, foi construída outra madrassa, cerca de duzenos anos depois, a madrassa Shir Dor. Devia servir como espelho da primeira, mas acabou por ser um pouco mais alta e elaborada. O seu nome advém dos dois tigres dourados que adornam a fachada, numa representação animal pouco comum no mundo islâmico.

A madrassa Shir Dor

Estas duas madrassas enquadram um terceiro edifício, mandado construir no topo norte da praça, onde antes existia um caravanserai. É a madrassa Tilla Kori, que significa feito de ouro e, efetivamente, o seu interior onde os pormenores dourados pontuam é impressionante.

O interior da madrassa Tilla Kori

Mas a sua fachada não o é menos: o grande nicho subdividido da entrada, ladeado de varandins e terminado por um delicado minarete em cada esquina, completam da melhor forma a grande praça.


Uma das alas laterais da madrassa Tilla Kori

Todo o conjunto é espetacular e protegido pela UNESCO. Mas parece ter também ganho o coração dos habitantes de Samarcanda: todos os dias aí se juntam noivos e convidados de muitas cerimónias de casamento, que parecem achar que não pode existir melhor cenário para as suas fotografias. E eu concordo!

Um casamento em Samarcanda...


2 comentários:

  1. Como sempre, um texto que me prendeu até à última letra. E as fotografias são lindas!!

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  2. Nas palavras e nas imagem viajei até 2018. Parabéns um excelente registo

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