segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Crónicas de uma viagem a Itália – Brescia, uma surpresa



Brescia, uma surpresa...

Brescia não é uma cidade muito turística, nem um destino de viagem muito óbvio.
Nós escolhemos a cidade porque ficava perto do Lago de Garda e já conhecíamos Verona, do outro lado do Lago. Então, porque não? Mas, para quem chega de comboio, como nós, a cidade não apresenta um aspeto convidativo. A zona à volta da estação parece ser uma zona mais pobre, onde residem emigrantes e pululam pedintes. As forças militares vigiam a entrada da estação, onde se aglomeram grupos de homens de todos os tons, que conversam alto, comem e bebem, enfim, passam o tempo. Só se veem restaurantes de kebab e comida chinesa, além da omnipresente McDonald’s! Para quem chega do mundo limpo e ordenado do Trentino, é um mergulho numa Itália bem diferente…
Mas basta caminhar um pouco pelo centro histórico da cidade para percebermos que Brescia esconde muitos segredos, à espera de serem revelados.
É uma cidade muito antiga, a Brixia romana, e as escavações, apenas iniciadas no século XIX, têm posto à luz um templo dedicado a Júpiter Capitolino e um teatro. Embora não tenha a grandiosidade dos vestígios romanos de outras cidades, vale a pena passar pelo Centro Interpretativo, que é recente e está muito bem feito.


O que resta do velho templo de Júpiter Capitolino

Ao longo dos tempos, Brescia teve vários invasores e dominadores, que deixaram as suas marcas. É o leão veneziano que nos recebe nos portões do castelo, enquanto na Piazza della Loggia há um memorial que recorda os dez dias de luta encarniçada contra o domínio austro-húngaro.
É interessante subir ao castelo, e não apenas pela magnífica vista que daí se tem sobre a cidade. Ao subir, deparamos com pequenas placas embutidas no chão, que nos acompanham como num calvário. Nas placas, encontram-se os nomes dos italianos que morreram vítimas de terrorismo, desde os atentados das Brigate Rosse dos anos 60, até aos mais recentes atentados ligados ao fundamentalismo religioso. Seja qual for o objetivo ou a ideologia que está por trás, um atentado é sempre uma violência estúpida e é imperativo recordar aqueles que com isso perderam a vida, às vezes por um acaso igualmente estúpido.


Subindo ao castelo

No castelo, encontramos outro registo histórico, de tipo totalmente diferente: uma velha locomotiva de 1906, que fez 2 milhões e meio de quilómetros ao serviço dos caminhos-de-ferro da região, conseguindo sobreviver incólume à Primeira e à Segunda Guerras Mundiais.


A velha locomotiva de 1906

O mesmo não aconteceu com muitas zonas da cidade, castigadas fortemente pelos bombardeamentos anglo-americanos de 1943/44. Dessa destruição nos dá testemunho a Igreja de Santa Maria dei Miracoli, da qual só sobreviveu a fachada, tapada pelos habitantes. Laboriosamente reconstruída, ainda mostra porém as marcas desses bombardeamentos.


A fachada da igreja da Santa Maria dei Miracoli

O centro de Brescia é formado por várias praças, que se articulam entre si. A grande Piazza della Vitoria, com os seus edifícios retilíneos, faz-nos regressar à estética fascista do tempo de Mussolini, mas a Piazza della Loggia e a Piazza del Duomo trazem-nos de novo para uma dimensão mais humana.


Piazza della Vitoria

A Piazza della Loggia, como o próprio nome indica, é dominada pelo Palazzo della Loggia, agora dedicado à memória dos brescianos que morreram pela pátria. Do outro lado da praça, mais um conjunto de arcadas encimado por um belo relógio astronómico, definindo assim um espaço harmonioso e equilibrado.


Piazza della Loggia, com a torre do relógio astronómico

Piazza della Loggia

Ao fundo, a Loggia...

Mas a minha praça preferida é a do Duomo. De um lado da praça, alinham-se o Duomo Vecchio, um belíssimo edifício de planta octogonal (e por isso também chamado de Rotonda) e o Duomo Nuovo, que veio substituir o anterior. E, ainda no mesmo alinhamento, ergue-se il Broletto, o velho edifício comunal, com a sua alta torre a afirmar o poder da cidade e dos seus cidadãos.

O Duomo Vecchio ou La Rotonda



O interior do Duomo Vecchio

E, ainda no mesmo alinhamento, ergue-se il Broletto, o velho edifício comunal, com a sua alta torre a afirmar o poder da cidade e dos seus cidadãos.
No interior d'Il Broletto

Qualquer destas praças é pedonal e tem esplanadas muito agradáveis, onde os italianos se reúnem ao fim da tarde para beberem os seus aperitivos, enquanto as crianças brincam e andam de bicicleta no vasto espaço aberto.


Ao entardecer, as esplanadas das praças enchem-se de vida

Mas eu disse que Brescia escondia segredos… vou revelar um! Numa pequena rua, a caminho do Templo Romano, quase não se dá pela entrada para o pequeno oratório de Santa Maria della Caritá.
Um velhote que estava à porta, ao ver-nos observar o dístico da igreja, chamou-nos: “Se quiserem visitar aproveitem agora, a igreja está quase a fechar!” Resolvemos seguir o chamamento e entrámos numa pequena mas belíssima igreja circular. A maior surpresa, todavia, escondia-se atrás do altar. Segundo o velhote nos explicou, ali estava uma réplica exata da casa de Maria, com a janela onde o anjo apareceu e tudo, tal como tinha sido transportada pelos anjos (ou seria a família degli Angeli?) desde a Palestina até à cidade italiana de Loreto.
E esta, hem?

Santa Maria della Caritá


Sem comentários:

Enviar um comentário