sábado, 15 de junho de 2019

A Varsóvia da Guerra


A memória dos bombardeamentos

Tínhamos decidido tirar um dia para a Varsóvia do tempo da guerra. Não é fácil nem imediato, porque não resta muita coisa. Mas os vestígios e as referências estão por toda a parte.
O gueto de Varsóvia ficou tristemente célebre; era a maior concentração forçada de judeus no mundo nazi e o seu destino foi cruel. Restou pouco: uma parte do muro, assinalada por uma placa; uma casa que sobreviveu à destruição e posterior reconstrução; uma marca no chão assinalando a linha onde o muro passava.

A linha que assinala os limites do gueto

A única casa do antigo gueto ainda de pé

Hoje, toda essa zona é residencial e os prédios e avenidas estendem-se, indiferentes ao passado. Resta de pé a velha prisão, também utilizada na época comunista.

Uma árvore coberta de evocações

O muro da antiga prisão

Perto da zona velha da cidade, há um conjunto escultórico duplo, que apresenta os insurgentes da insurreição de 1944. O seu símbolo surge em vários locais inesperados, até em tatuagens, e assim se percebe que os polacos têm orgulho na sua resistência ao invasor. Uma parte do conjunto escultórico mostra-nos os combatentes, outra mostra-nos os que, já no desespero final, fugiram das tropas nazis pelos esgotos.

Memorial aos insurgentes de 1944...

... incluindo os que fugiram pelos esgotos

Uma pequena estátua, muito tocante, lembra as crianças que lutaram e morreram, ao lado dos adultos.

Memorial às crianças que combateram ao lado dos adultos
Para quem se interessa pelo tema, há dois museus que são imperdíveis: o Museu Polin e o Museu da Insurreição de Varsóvia.
O Museu Polin percorre a história dos Judeus na Polónia. O Museu apenas foi inaugurado em 2014 e é uma espantosa obra de arquitetura mas, acima de tudo, é um extraordinário testemunho do que foi a vida dos judeus nesta região, desde os primeiros contactos de mercadores, no século XI, até aos terríveis acontecimentos do século XX e à atualidade. Há um percurso recomendado, que nos leva através de oito zonas, cada uma explorando uma época da História. Há um grande equilíbrio no tratamento de todas as épocas, mostrando os pormenores da vida quotidiana, mas também os grandes eventos ou decisões coletivas que influenciaram a comunidade. Há muitos documentos em exposição, mas percebe-se que é a imagem que é mais valorizada, através de desenhos, filmes, projeções, instalações interativas. É um museu fascinante, onde nos podemos facilmente perder por três ou quatro horas.

O Museu Polin

Reconstituição de uma antiga sinagoga de madeira

O Museu da Insurreição de Varsóvia é também um museu muito interessante. Faz-nos mergulhar no mundo de repressão, terror, desespero e revolta da Varsóvia dos anos da guerra. As imagens, associadas ao som e às instalações de vídeo, tornam a experiência muito intensa.
A revolta eclodiu em 1944 e, durante dois meses, a população de Varsóvia lutou contra o poderoso exército alemão. Apesar da desproporção de forças, conseguiram dominar muitas zonas da cidade, até que a falta de armas e de mantimentos os levou à rendição. Talvez uma ajuda dos Aliados tivesse levado a um desfecho diferente, mas os Soviéticos, estacionados do outro lado do rio, deixaram os Polacos a lutar sozinhos. Talvez Stalin já antecipasse o domínio soviético desta zona e preferisse um povo fraco e desmoralizado a um governo forte, independente e representativo.

O símbolo da Insurreição

A primeira guarita tomada pelos insurretos

O que é um facto é que alguns líderes da revolta, sobreviventes da guerra, foram presos pelos russos e não sobreviveram aos seus tenebrosos campos de trabalhos forçados.
Durante a revolta e a terrível repressão alemã, milhares de resistentes, homens, mulheres e crianças, perderam a vida. Já sem lugar para as sepulturas, nem mesmo junto aos pequenos santuários dos pátios, começaram a enterrá-los debaixo dos escombros. E assim Varsóvia terminou a guerra, uma cidade de ruínas e de cruzes.

O grande memorial aos resistentes do Gueto

A parte de trás do Memorial lembra os judeus perseguidos

Dirijo-me para o aeroporto, pelas avenidas largas e modernas de uma cidade renascida e cheia de dinamismo económico. Os habitantes não são os mesmos, provavelmente já nem descendem dos heroicos resistentes de 44, mas, de algum modo, estes bairros modernos e vibrantes são uma homenagem aos milhares que morreram pela libertação e independência de Varsóvia.
 
As modernas avenidas que cruzam Varsóvia

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