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Vista panorâmica de Praga, a partir da Ilha de Kempa |
Praga é uma cidade belíssima, com um encanto muito
particular. Tem um charme próprio, um pouco nostálgico. Chamam-lhe a
cidade das cem cúpulas, devido às torres das igrejas e das muralhas que pontuam
a paisagem urbana. Desenvolveu-se muito no final da Idade Média e, depois da
destruição durante a Guerra dos Trinta Anos, renasceu mais bela do que nunca
sob os Habsburgos. Teve a sorte de não sofrer grandes danos com a Segunda
Guerra Mundial e hoje surge-nos com o seu encanto gótico ou barroco ou Arte
Nova, fresco e genuíno.
A Catedral de São Vito, vista da entrada do Castelo
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A Torre da Pólvora |
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Velhos frescos nas paredes do moderno Hard Rock Café |
O que vemos e experienciamos não é fruto de uma
reconstituição revivalista, é o original. Caminhamos nas mesmas
calçadas que Frank Kafka calcorreou; subimos as mesmas íngremes escadas de
madeira que Tycho Brahé subiu; sentamo-nos nos bancos da mesma praça onde Jan
Huss pregou. Para mim, isto é emocionante. É como se sentisse o correr dos
séculos nas minhas veias.
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Capela onde Mozart tocou, no Clementinum |
Não é necessário visitar todos os palácios e igrejas para
sentir o encanto de Praga. A beleza transbordou do interior para os exteriores.
Ao passearmos pelas ruas da cidade ou ao atravessarmos as suas pontes, o nosso
olhar é irresistivelmente atraído para os frescos nas paredes das casas, os
relevos, as esculturas que enfeitam as frontarias ou se espalham pelo espaço
urbano.
São Venceslau num edifício da Praça Velha Relevos pelas ruas do Bairro Antigo
Praga espalha-se pelas duas margens do rio Vltava, pouco
antes da sua confluência com o Elba. O rio segue um percurso sinuoso pela
cidade, pontuado por belas e antigas pontes. A mais conhecida é a Ponte Carlos.
Reza a lenda que o Imperador Carlos IV pediu aos astrólogos para indicarem a
melhor hora e dia para se iniciarem as obras e eles concluiram que o dia 9 de
julho de 1357, às 5 horas e 31 minutos, seria o momento ideal, pois esse
horário criaria uma sequência ascendente e descendente de números ímpares
(1-3-5-7-9-7-5-3-1). E assim foi...Estátua do Comendador, personagem da ópera Don Giovanni, de Mozart
Torre de entrada na Ponte Carlos Estátuas ladeiam a Ponte Carlos Uma represa no rio Vltava
É uma ponte belíssima, ladeada por duas torres e pontuada por
estátuas de reis e santos, que abençoavam aquela ligação entre o castelo e os
bairros da outra margem, mais comerciais e profanos. O turismo de massas tomou
conta da ponte e hoje é dificil encontrar um momento em que não esteja
carregada de turistas e cheia de barraquinhas a vender todo o tipo de serviços
e souvenirs.
A Ponte Carlos numa manhã de chuva
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A grande roda de azenha na Ilha de Kempa |
Mas há outras pontes que vale a pena atravessar e explorar
com calma. Há muitos pormenores decorativos a não perder. Também vale a pena
passear pelas pequenas ilhas, como a Ilha Kempa. Ainda se podem ver as grandes
rodas dos moinhos de água e, ao percorrer os parques e relvados, têm-se belas
vistas panorâmicas da cidade, do rio Vltava e das represas que mantinham o rio
navegável.
A Ponte Svatopluk Cech tem belos pormenores arte nova A base dos candeeiros da Ponte Svatopluk Cech
O Imperador Carlos IV, do Sacro Império Romano Germânico, é
uma figura importante da cidade e da Boémia. Além da ponte que leva o seu nome,
fundou a Universidade, reconstruiu o Castelo, fundou ou reconstruiu vários
mosteiros e igrejas, criou a Cidade Nova de Nové Mesto. A rua Carlos, ou
Karlova, é das mais belas da cidade; cada edifício competindo pela decoração
mais bela. Confesso que a minha favorita é a estátua arte nova da princesa
Libuse, a lendária fundadora de Praga, rodeada de rosas.Na Ponte Legií, os candeeiros mostram trabalhos relacionados com o rio
Estátua do rei Carlos IV Uma esquina na rua Karlova
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Combate de gigantes na entrada do Palácio Real |
Um dos aspetos que me fascinou em Praga foi este cuidado com o embelezamento das ruas e das frontarias dos prédios. São incontáveis os edifícios que ostentam frescos maravilhosos ou estátuas imponentes. Por vezes, são apenas percorridos por frisos florais e sinuosos, numa afirmação da Arte Nova que aqui floresceu – ou não tivesse aqui trabalhado Alfons Mucha. A Casa Municipal é o mais destacado dos edifícios Arte Nova da cidade. O interior foi decorado por Mucha mas, na fachada, destaca-se o mural de mosaico “Homenagem a Praga”, de Karel Spillar.
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A fachada da Casa Municipal |
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Prédio com ornamentação arte nova |
Esta tradição do embelezamento do espaço urbano continua até
aos dias de hoje. Há inúmeras estátuas que nos confrontam e nos fazem pensar
sobre o seu significado. O conhecido escultor checo David Cerny tem três
trabalhos expostos na cidade, todos fascinantes: o busto de Franz Kafka, de 42
camadas em movimento; o homem pendurado, que representa Sigmund Freud e é tão
realista que levou transeuntes a ligar para a polícia; e o mais enigmático de
todos, dois homens urinando para o mapa da Chéquia, no pequeno largo fronteiro
ao Museu Kafka.
O busto de Kafka O homem pendurado Dois homens urinando para a Chéquia
Todos os passeios pelas ruas de Praga vão certamente confluir
na Praça da Cidade Velha. Antiga praça do mercado, hoje o centro da cidade de Praga,
tem uma tal densidade de edifícios extraordinários, da época medieval ao
barroco, que se torna até difícil de abarcar. Quando ali estivemos, um
mercadinho de Páscoa, cheio de ovos, coelhos e flores, ainda dificultava mais a
visualização da praça no seu conjunto mas, seja qual for a perspetiva, é sempre
magnífica.
A Torre da antiga Câmara Municipal O Palácio Kinsky
Duas igrejas icónicas enquadram a praça: a Igreja de S.
Nicolau, hoje dedicada a concertos, e a Igreja de Nossa Senhora de Týn, cujo
interior é um pouco sombrio mas exibe os dois extraordinários campanários que,
de algum modo, definem a ideia que temos da velha cidade de Praga. A igreja
gótica quase desaparece atrás de uma colunata românica, o que torna a entrada um
pouco difícil de encontrar.
O perfil inconfundível de Nossa Senhora de Tyn
À volta da praça, alinham-se os palácios barrocos, com belas fachadas
adornadas por baixos relevos, frescos e estuques elaborados, como o Palácio
Golz-Kinsky. Vale a pena percorrer a praça com calma e perder os olhos pelos
pormenores decorativos. No meio da praça ergue-se o enorme monumento a Jan
Huss, o reformador religioso acusado de heresia e morto em 1415. Este memorial foi
inaugurado em 1915, no 500.º aniversário da sua morte.Dentro da Igreja de S. Nicolau
Monumento a Jan Huss. À esquerda vê-se a Igreja de S. Nicolau
A estrela da Praça Velha, porém, é o Relógio Astronómico
colocado na parede exterior da antiga Câmara Municipal. Data do século XV e,
portanto, ainda encontramos a Terra firmemente fixada no centro do sistema
solar. Está dividido em três patamares: o de baixo, é o calendário; o do centro
representa as órbitas do Sol e da Lua ao redor da Terra assim como os signos do
zodíaco; e a parte de cima apresenta a procissão dos apóstolos, que rodam por
uma portinhola de cada vez que o relógio bate as horas. Há sempre uma multidão na
praça fronteira, ansiosa por filmar ou fotografar a procissão dos apóstolos. Pessoalmente,
acho mais interessante o relógio astronómico propriamente dito. Através dos
seus belos desenhos e cores, mostra-nos como era a visão do mundo no século XV
e isso já não é pouca coisa.
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