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A mesquita Bolo Hauz com a sua grande piscina de ablução |
Chegámos a Bukhara ao fim da tarde, o que foi uma vantagem
inesperada. Depois da instalação no hotel e do jantar, saímos para um passeio
noturno pela cidade, numa espécie de exploração inicial do espaço. E isso
permitiu-nos ter uma primeira impressão quase feérica daquele que foi um dos
principais centros da Rota da Seda.
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O minarete Kalom à noite |
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A mesquita Kalom à noite |
Para o viajante, Bukhara tem uma grande vantagem em relação a
Samarkanda: o centro histórico, a cidade antiga, é relativamente homogéneo e
consegue calcorrear-se a pé, absorvendo as formas, as cores, os cheiros, enfim,
o espaço. Antigamente, estava dividida em duas zonas, a judaica e a muçulmana.
Os principais monumentos situam-se na zona muçulmana, mas os judeus tinham uma
importância muito grande no comércio e na economia da cidade. Hoje, o bairro judeu está quase despovoado de judeus,
que emigraram para Israel. Mas é consolador estar numa cidade de onde os judeus
saíram por escolha e não em fuga de perseguições e tentativas de extermínio.
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À noite, as velhas zonas comerciais estão encerradas |
Mesmo assim, alguns persistem no seu bairro. Fomos almoçar a
uma casa particular, que recebe pequenos grupos de comensais. Aí pudemos
apreciar, não só o “arroz pilaf” característico da região, como o requinte
decorativo da própria casa, que nada no exterior traduz.
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Entrar numa casa particular... |
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... com interiores belos e delicados. |
Bukhara é uma cidade belíssima, cheia de motivos de
interesse, tantos que tenho até dificuldade em fazer uma seleção. Um dos
monumentos mais fascinantes da cidade – e o mais antigo – é o mausoléu do
fundador da dinastia samânida, Ismail Samani, datado do século X. Alberga
também os sarcófagos de outros membros da sua família. É totalmente construído
com pequenos tijolos, organizados em padrões delicados e intricados, por baixo
de uma abóboda circular.
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O mausoléu de Ismail Samani |
Reza a história que, quando da invasão de Gengis-Khan, os
habitantes de Bukhara enterraram o mausoléu em areia e lama, para o protegerem.
Efetivamente, foi poupado à destruição e só foi descoberto e recuperado na
década de 30 do século XX!
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O trabalho em tijolo é bem patente no interior do mausoléu |
Pior sorte tiveram todos os outros monumentos de Bukhara.
Gengis-khan mandou arrasar a cidade. Só poupou da destruição o minarete Kalom,
do século XII, tão belo que sensibilizou o próprio Khan. Pioneiro no uso da
cerâmica azul, o minarete ali se mantém, tão belo de dia como de noite...
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No interior da mesquita Kalom |
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O tanque de abluções da mesquita Kalom |
O centro histórico de Bukhara inclui várias mesquitas e
madrassas, todas interessantes e todas diferentes dentro da sua traça
arquitetónica muito peculiar. Muitas estão desativadas das suas funções
religiosas e funcionam como espaço de espetáculos, ou hotéis, ou simplesmente
como bazares, onde tudo se pode comprar e vender. Afinal, estamos no coração da
Rota da Seda e o negócio comanda a vida!
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A mesquita Chor Minor |
Recordo a pequena e original Chor Minor, com os seus quatro
minaretes rematados com cúpulas azul-turquesa. A madrassa Ulughbek é uma das
mais antigas e interessantes: foi um centro de estudos de teologia, mas
também de matemática, astronomia, geografia. Ulughbek, neto de Tamerlão, é uma
personagem fascinante, sobre quem escreverei no texto sobre Samarkanda, a
propósito do Observatório que aí construiu.
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Parede lateral da madrassa Ulughbek |
A madrassa Abdulaziz khan é uma das mais ricamente decoradas,
mas eu confesso que a recordo melhor por ter sido o local onde comprei duas
belíssimas almofadas, bordadas a fio de seda, com os motivos tradicionais
uzbeques.
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O belo pórtico de entrada na madrassa Abdulaziz khan |
Em volta da grande praça Lyabi Hauz, erguem-se três madrassas
majestosas, construídas entre os séculos XV e XVI. Uma delas, a madrassa Nadir
Divan Begi, foi construída com a intenção de funcionar como um “caravanserai”,
mas foi convertida em espaço cultural. No seu aprazível pátio central, assistimos
a um espetáculo de música e dança tradicional. Gostei muito, foi muito bonito,
não só devido à graciosidade e aos ricos trajes das bailarinas, mas também
devido às sonoridades dos instrumentos tradicionais, tão evocativas da Rota da
Seda.
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O pórtico da madrassa Nadir Divan Begi, com o seu invulgar sol antropomórfico |
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Bailarinas com os trajes tradicionais |
No centro dessa praça, um enorme reservatório de água faz as
vezes de um lago. Integra um vasto sistema de irrigação e de piscinas de
ablução que utilizavam a água, muito abundante, dos lençóis freáticos. A praça
é muito agradável, com jardins a rodearem a grande piscina e esplanadas onde
apetece sentar e deixar o tempo correr, devagarinho...
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A praça Lyabi Hauz |
Deixei para o final a referência à mesquita Bolo Hauz, talvez
porque foi das que mais me impressionou. A primeira imagem que temos dela é a
de uma profusão de colunas de madeira, ricamente esculpidas, que decora a
entrada.
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A colunata da mesquita Bolo Hauz |
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O mihrab da mesquita |
Fui-me apercebendo de que as colunas de madeira esculpida são
elementos arquitetónicos comuns e característicos desta região, mas a colunata
desta mesquita foi a primeira que encontrei. A beleza das suas vinte colunas,
refletidas na piscina de ablução, é impressionante e não encontra paralelo...
pelo menos até chegarmos à mesquita Juma, em Khiva. Mas sobre esta mesquita
escreverei depois...
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O pequeno minarete frente à mesquita Bolo Hauz |