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Brescia, uma surpresa... |
Brescia não é uma cidade muito turística, nem um destino de viagem muito
óbvio.
Nós escolhemos a cidade porque ficava perto do Lago de Garda e já
conhecíamos Verona, do outro lado do Lago. Então, porque não? Mas, para quem
chega de comboio, como nós, a cidade não apresenta um aspeto convidativo. A
zona à volta da estação parece ser uma zona mais pobre, onde residem emigrantes
e pululam pedintes. As forças militares vigiam a entrada da estação, onde se
aglomeram grupos de homens de todos os tons, que conversam alto, comem e bebem,
enfim, passam o tempo. Só se veem restaurantes de kebab e comida chinesa, além da
omnipresente McDonald’s! Para quem chega do mundo limpo e ordenado do Trentino,
é um mergulho numa Itália bem diferente…
Mas basta caminhar um pouco pelo centro histórico da cidade para
percebermos que Brescia esconde muitos segredos, à espera de serem revelados.
É uma cidade muito antiga, a Brixia romana, e as escavações, apenas
iniciadas no século XIX, têm posto à luz um templo dedicado a Júpiter
Capitolino e um teatro. Embora não tenha a grandiosidade dos vestígios romanos
de outras cidades, vale a pena passar pelo Centro Interpretativo, que é recente
e está muito bem feito.
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O que resta do velho templo de Júpiter Capitolino |
Ao longo dos tempos, Brescia teve vários invasores e dominadores, que
deixaram as suas marcas. É o leão veneziano que nos recebe nos portões do
castelo, enquanto na Piazza della Loggia há um memorial que recorda os dez dias
de luta encarniçada contra o domínio austro-húngaro.
É interessante subir ao castelo, e não apenas pela magnífica vista que
daí se tem sobre a cidade. Ao subir, deparamos com pequenas placas embutidas no
chão, que nos acompanham como num calvário. Nas placas, encontram-se os nomes
dos italianos que morreram vítimas de terrorismo, desde os atentados das Brigate Rosse dos anos 60, até aos mais
recentes atentados ligados ao fundamentalismo religioso. Seja qual for o
objetivo ou a ideologia que está por trás, um atentado é sempre uma violência
estúpida e é imperativo recordar aqueles que com isso perderam a vida, às vezes
por um acaso igualmente estúpido.
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Subindo ao castelo |
No castelo, encontramos outro registo histórico, de tipo totalmente
diferente: uma velha locomotiva de 1906, que fez 2 milhões e meio de
quilómetros ao serviço dos caminhos-de-ferro da região, conseguindo sobreviver
incólume à Primeira e à Segunda Guerras Mundiais.
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A velha locomotiva de 1906 |
O mesmo não aconteceu com muitas zonas da cidade, castigadas fortemente
pelos bombardeamentos anglo-americanos de 1943/44. Dessa destruição nos dá
testemunho a Igreja de Santa Maria dei Miracoli, da qual só sobreviveu a
fachada, tapada pelos habitantes. Laboriosamente reconstruída, ainda mostra porém as marcas desses
bombardeamentos.
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A fachada da igreja da Santa Maria dei Miracoli |
O centro de Brescia é formado por várias praças, que se articulam entre
si. A grande Piazza della Vitoria, com os seus edifícios retilíneos, faz-nos
regressar à estética fascista do tempo de Mussolini, mas a Piazza della Loggia
e a Piazza del Duomo trazem-nos de novo para uma dimensão mais humana.
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Piazza della Vitoria |
A Piazza della Loggia, como o próprio nome indica, é dominada pelo
Palazzo della Loggia, agora dedicado à memória dos brescianos que morreram pela
pátria. Do outro lado da praça, mais um conjunto de arcadas encimado por um
belo relógio astronómico, definindo assim um espaço harmonioso e equilibrado.
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Piazza della Loggia, com a torre do relógio astronómico |
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Piazza della Loggia |
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Ao fundo, a Loggia... |
Mas a minha praça preferida é a do Duomo. De um lado da praça, alinham-se
o Duomo Vecchio, um belíssimo edifício de planta octogonal (e por isso também
chamado de Rotonda) e o Duomo Nuovo, que veio substituir o anterior. E, ainda
no mesmo alinhamento, ergue-se il
Broletto, o velho edifício comunal, com a sua alta torre a afirmar o poder
da cidade e dos seus cidadãos.
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O Duomo Vecchio ou La Rotonda |
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O interior do Duomo Vecchio
E, ainda no mesmo alinhamento, ergue-se il Broletto, o velho edifício comunal, com a sua alta torre a afirmar o poder da cidade e dos seus cidadãos. |
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No interior d'Il Broletto |
Qualquer destas praças é pedonal e tem esplanadas muito agradáveis, onde
os italianos se reúnem ao fim da tarde para beberem os seus aperitivos,
enquanto as crianças brincam e andam de bicicleta no vasto espaço aberto.
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Ao entardecer, as esplanadas das praças enchem-se de vida |
Mas eu disse que Brescia escondia segredos… vou revelar um! Numa pequena
rua, a caminho do Templo Romano, quase não se dá pela entrada para o pequeno oratório
de Santa Maria della Caritá.
Um velhote que estava à porta, ao ver-nos observar o dístico da igreja,
chamou-nos: “Se quiserem visitar aproveitem agora, a igreja está quase a
fechar!” Resolvemos seguir o chamamento e entrámos numa pequena mas belíssima
igreja circular. A maior surpresa, todavia, escondia-se atrás do altar.
Segundo o velhote nos explicou, ali estava uma réplica exata da casa de Maria,
com a janela onde o anjo apareceu e tudo, tal como tinha sido transportada
pelos anjos (ou seria a família degli Angeli?) desde a Palestina até à cidade
italiana de Loreto.
E esta, hem?
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Santa Maria della Caritá |