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A memória dos bombardeamentos |
Tínhamos decidido tirar um dia para a
Varsóvia do tempo da guerra. Não é fácil nem imediato, porque não resta muita
coisa. Mas os vestígios e as referências estão por toda a parte.
O gueto de Varsóvia ficou tristemente
célebre; era a maior concentração forçada de judeus no mundo nazi e o seu
destino foi cruel. Restou pouco: uma parte do muro, assinalada por uma placa;
uma casa que sobreviveu à destruição e posterior reconstrução; uma marca no
chão assinalando a linha onde o muro passava.
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A linha que assinala os limites do gueto |
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A única casa do antigo gueto ainda de pé |
Hoje, toda essa zona é residencial e
os prédios e avenidas estendem-se, indiferentes ao passado. Resta de pé a velha
prisão, também utilizada na época comunista.
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Uma árvore coberta de evocações |
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O muro da antiga prisão |
Perto da zona velha da cidade, há um
conjunto escultórico duplo, que apresenta os insurgentes da insurreição de
1944. O seu símbolo surge em vários locais inesperados, até em tatuagens, e
assim se percebe que os polacos têm orgulho na sua resistência ao invasor. Uma
parte do conjunto escultórico mostra-nos os combatentes, outra mostra-nos os
que, já no desespero final, fugiram das tropas nazis pelos esgotos.
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Memorial aos insurgentes de 1944... |
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... incluindo os que fugiram pelos esgotos |
Uma pequena
estátua, muito tocante, lembra as crianças que lutaram e morreram, ao lado dos
adultos.
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Memorial às crianças que combateram ao lado dos adultos |
Para quem se interessa pelo tema, há
dois museus que são imperdíveis: o Museu Polin e o Museu da Insurreição de
Varsóvia.
O Museu Polin percorre a história dos
Judeus na Polónia. O Museu apenas foi inaugurado em 2014 e é uma espantosa obra
de arquitetura mas, acima de tudo, é um extraordinário testemunho do que foi a
vida dos judeus nesta região, desde os primeiros contactos de mercadores, no
século XI, até aos terríveis acontecimentos do século XX e à atualidade. Há um
percurso recomendado, que nos leva através de oito zonas, cada uma explorando
uma época da História. Há um grande equilíbrio no tratamento de todas as
épocas, mostrando os pormenores da vida quotidiana, mas também os grandes
eventos ou decisões coletivas que influenciaram a comunidade. Há muitos
documentos em exposição, mas percebe-se que é a imagem que é mais valorizada,
através de desenhos, filmes, projeções, instalações interativas. É um museu
fascinante, onde nos podemos facilmente perder por três ou quatro horas.
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O Museu Polin |
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Reconstituição de uma antiga sinagoga de madeira |
O Museu da Insurreição de Varsóvia é
também um museu muito interessante. Faz-nos mergulhar no mundo de repressão,
terror, desespero e revolta da Varsóvia dos anos da guerra. As imagens,
associadas ao som e às instalações de vídeo, tornam a experiência muito
intensa.
A revolta eclodiu em 1944 e, durante
dois meses, a população de Varsóvia lutou contra o poderoso exército alemão.
Apesar da desproporção de forças, conseguiram dominar muitas zonas da cidade,
até que a falta de armas e de mantimentos os levou à rendição. Talvez uma ajuda
dos Aliados tivesse levado a um desfecho diferente, mas os Soviéticos,
estacionados do outro lado do rio, deixaram os Polacos a lutar sozinhos. Talvez
Stalin já antecipasse o domínio soviético desta zona e preferisse um povo fraco
e desmoralizado a um governo forte, independente e representativo.
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O símbolo da Insurreição |
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A primeira guarita tomada pelos insurretos |
O que é um facto é que alguns líderes
da revolta, sobreviventes da guerra, foram presos pelos russos e não
sobreviveram aos seus tenebrosos campos de trabalhos forçados.
Durante a revolta e a terrível
repressão alemã, milhares de resistentes, homens, mulheres e crianças, perderam
a vida. Já sem lugar para as sepulturas, nem mesmo junto aos pequenos
santuários dos pátios, começaram a enterrá-los debaixo dos escombros. E assim
Varsóvia terminou a guerra, uma cidade de ruínas e de cruzes.
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O grande memorial aos resistentes do Gueto |
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A parte de trás do Memorial lembra os judeus perseguidos |
Dirijo-me para o aeroporto, pelas
avenidas largas e modernas de uma cidade renascida e cheia de dinamismo
económico. Os habitantes não são os mesmos, provavelmente já nem descendem dos heroicos
resistentes de 44, mas, de algum modo, estes bairros modernos e vibrantes são uma homenagem aos milhares que
morreram pela libertação e independência de Varsóvia.
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As modernas avenidas que cruzam Varsóvia |