Às vezes, pergunto a mim própria de onde vem este gosto errante que me levaria, se pudesse, a calcorrear o mundo, sempre em busca do que é diferente e genuíno em cada local. Olhando para trás, acredito que esse gosto nasceu numa viagem aos Açores, no ano já longínquo de 1965.
O meu pai adorava viajar. A sua viagem de sonho era a travessia da Ásia no comboio Transiberiano, até Vladivostok. Falava nisso muitas vezes e, embora tenha viajado muito pela Europa, nunca chegou a concretizar esse seu sonho. De vez em quando, metia-nos a todos no carro e partíamos, quase à aventura, pelos caminhos mais inexplorados de Portugal, ou à descoberta das terreolas espanholas mais esquecidas. Sempre sem marcações, ao sabor do momento, um pouco errantes. Mas, naquele ano, fez-nos uma surpresa: um cruzeiro pelos arquipélagos da Madeira e dos Açores.
(Partida da barra do Tejo)
A viagem, em si, já era uma aventura e foi memorável. Embarcámos no velho navio Carvalho Araújo, que fazia transporte de pessoas mas também de mercadorias. Tudo para mim era uma novidade, começando pelas refeições servidas a bordo, na grande sala que também servia de sala de estar entre as refeições, e e onde os homens se entretinham a jogar e as senhoras a conversar. Como havia poucas crianças a bordo, os criados eram uma simpatia e passavam o tempo a dar-me gulodices o que, provavelmente, me impediu de enjoar durante as tempestades que suportámos no caminho até à Madeira.
Passava horas na amurada do navio, a ver os peixes que saltavam ao lado do barco, ou simplesmente a apreciar as voltas que a água dava.
Mas a minha grande descoberta e o meu grande fascínio, foram as ilhas dos Açores. A viagem durava dezoito dias e o navio parava em todas as ilhas. Isto é, com excepção de S. Miguel, parava ao largo e depois éramos transportados em barquinhos pequenos até às ilhas, já que aí só existiam embarcadouros para barcos de pesca.
(Eu, num jardim da ilha de S. Jorge)
As ilhas eram belíssimas, mas com a beleza dura e agreste da natureza pura. Recordo-me bem das estufas de ananazes e das estradas bordejadas de hortênsias da ilha de S. Miguel, ou da moderna Base Aérea das Lages, na ilha Terceira, onde me lembro de ir almoçar.
(Vista da Lagoa das Sete Cidades, em S. Miguel)
Mas houve outros locais que me marcaram bem mais. Lembro-me do taxista que nos foi mostrar o local onde o Vulcão dos Capelinhos tinha feito surgir nova terra de um dia para o outro, prolongando a ilha tão verde num promontório ainda negro de lava arrefecida. Recordo o pequeno aeródromo da ilha de Santa Maria, com tão pouco tráfego aéreo que as vacas por lá pastavam tranquilamente, o que lhe tinha valido o epíteto de “aerovacas”. Volto a sentir a sensação incrível de descer, num cesto de verga preso por uma corda, o enorme buraco do Caldeirão da Graciosa.
(A nova terra negra, criada pelo vulcão dos Capelinhos)
Mas, mais do que qualquer outra, lembro a pequena ilha do Corvo. A mais ocidental e mais longínqua das ilhas dos Açores, muitas vezes isolada meses a fio devido ao estado do mar, recebia em festa o barco que chegava ao largo: era o dia de S. Vapor. Todos os habitantes se vestiam com os seus melhores fatos, muitas mulheres de negro, e desciam até ao pequeno ancoradouro, dimensionado para os barcos de pesca e os baleeiros.
(Chegada ao Corvo)
No dia em que chegámos, tinham apanhado uma baleia. Tinha sido trazida até ao pequeno porto e ali estava ainda, deitada de lado, maior do que os barcos. O mar estava vermelho do sangue do majestoso animal, mas ninguém parecia prestar atenção, concentrados nos pequenos barquitos que chegavam. Ali, naqueles pequenos barcos, chegava o correio e as encomendas, gente de fora (poucos!), gente do Corvo que regressava do Continente (alguns!), enfim, chegava o Mundo!
Eu tinha estado doente nos últimos dois dias, com uma gastroenterite, e estava debilitada. O meu pai pagou a um homem, no porto, para me levar às costas até ao Caldeirão do Corvo, a belíssima lagoa vulcânica no centro da ilha, enquanto o resto do grupo ia a pé. No caminho, o homem deu um pontapé numa pedra, feriu um dedo, mas não parou nem disse nada, para minha grande aflição, ali bem instalada às suas cavalitas.
(O nosso navio, ao largo da ilha do Corvo)
Já voltei aos Açores. Os caminhos continuam bordejados por hortênsias, e a natureza continua esplendorosa e autêntica. Em quase tudo o mais, felizmente, a diferença é grande. No entanto, as impressões daquela minha primeira viagem nunca se apagaram.
Há quem diga que só as grandes viagens valem a pena, porque nos confrontamos realmente com o Outro, com um mundo diferente do nosso. Para mim, uma miúda de seis anos de Lisboa, aquelas pessoas vestidas de festa à espera de um barco que nunca se sabia quando chegava, à beira de um mar vermelho de sangue, eram verdadeiramente o Outro, com um mundo inteiro a separar-nos.
Lindo isso,Teresa.E como é estranha a volta aos lugares que havíamos visitado em crianças, não? É tudo um outro olhar...beijos e tudo de bom,chica
ResponderEliminarFiz uma viagem fantástica...
ResponderEliminarObrigado pela oportunidade...
Um beijo grande.
Paz
__________________União
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Excelente relato de uma viagem que ficou para sempre na memoria. E alem disso deixou bem inculcado o bichinho das viagens.
ResponderEliminarBeijinhos
Olá Teresa!
ResponderEliminarAfinal o seu gosto pelas viagens e pelo desconhecido é uma herança paterna. Eu também sou um pouco como o seu pai, não gosto de programar muito e quando programo, acabo por alterar tudo à medida que vou avançando.
Um BOM NATAL e um 2010 pelo menos com muita saúde.
Abraços.
Chica
ResponderEliminarÉ sempre bom voltar aos lugares onde já estivemos, desde que não esperemos que estejam iguais!
Bjs
Sereia
ResponderEliminarObrigada pelos votos. Ainda não comecei a enviar os meus votos de bom Natal.
Bjs
Vagamundos
ResponderEliminarÉ verdade. Foi uma viagem que ficou na memória.
Bjs
João
ResponderEliminarSabe que eu já tinha percebido isso, ao ler os relatos das suas viagens? Eu também gosto de andar ao sabor do momento, embora com os miúdos pequenos me tenha desabituado.
Bjs
No hace falta hacer grandes viajes para sentir algo sorprendente o inesperado, normalmente ocurre donde menos te esperas.
ResponderEliminarLas fotos preciosas
Intentando recorrer el mundo
Olá Teresa
ResponderEliminarobrigado por este post! Por essa "viagem" que me proporcionaste, aos Açores, no ano em que nasci...
Trata-se de um dos sítios que mais anseio conhecer, pela beleza daquele verde todo, a natureza em todo o seu esplendor e, acima de tudo, por aquela gente boa e interessante.
Obrigado pelo post e BOM NATAL!
M. Eugenia
ResponderEliminarTodas as viagens nos podem trazer algo de inesperado ou surpreendente. Importante é manter o espírito aberto à surpresa, ao encantamento, ao que é diferente.
Bjs
Manuel
ResponderEliminarPronto, não foi de propósito, mas ainda bem que acertei. A fingir que foi uma prenda de Natal.
Quanto à natureza, sim, os Açores são um conjunto de paisagens maravilhoso. As pessoas são boas e más e assim-assim, como em todo o lado! Leste "Gente Feliz com Lágrimas" do João de Melo, se não estou em erro? Retrata bem o que eram os Açores dessa época. Mas, sim, essa viagem marcou-me muito.
Bjs
Excelente narrativa de viagens. O pormenor descritivo com o toque do olho clínico e sensível da boa memória. Já cá não vinha há muito... já tinha saudades destas viagens...
ResponderEliminarOlá Luis
ResponderEliminarObrigada por teres saudades das minhas viagens.
Olá Teresa
ResponderEliminargostei tanto de ler estas tuas memórias sobre os Açores em particular sobre o Corvo essa ilha tão especial, espero,antes de terminar esta minha peregrinação sobre a terra voltar lá mais uma vez.Bem haja
Olá Magda
ResponderEliminarSabia que, desta vez, não resistias a fazer um comentário. Lembrei-me muitas vezes de ti e da tua mãe, enquanto escrevia este texto. Espero que consigas lá voltar. Vamos as duas!
Bjs e Bom Natal
Desejo que o seu Natal seja brilhante de alegria, iluminado de amor, paz e harmonia. Feliz Natal!!!
ResponderEliminarFELIZ NATAL!
ResponderEliminarBJS
Muito interessante este depoimento de viagem.
ResponderEliminarConheci ''por fora'' o ''navio Carvalho de Araújo'',... fui para Angra em 1970 no -Angra do Heroísmo- e passados 2 meses regressei no ''cacilheiro'' -Ponta Delgada- os pratos voavam das mesas e enjoei à séria...
Viagens de outros tempos...
Fui para Angola com centena e meia de açoreanos...
Já lá voltei e tenciono revisitar...
Olá António
ResponderEliminarSão mesmo viagens de outros tempos, em que tudo era mais complicado, mas se foi para Angra em 1970, deve lembrar-se destes Açores que eu recordo tembém.
Bjs e volte sempre.
Os Açores são um verdadeiro paraíso na terra; aquelas ilhas, aquelas paisagens são obras de arte divina.
ResponderEliminarOlá Teresa,
ResponderEliminarNada acontece por acaso. Herdamos dos nossos as suas formas de vida. Também herdei dos meus pais o gosto de conhecer. Lembro-me que embora nunca tenha saído de Portugal, foram eles que me deram a conhecer grande parte do nosso país. E ainda ficou tanto por ver...
Zeus
ResponderEliminarÉ verdade, os Açores são ilhas muito belas, ainda não completamente descaracterizadas pelo turismo. Bem vindo a este meu espaço. Volte sempre.
Olá Nocas
ResponderEliminarE se bem me apercebi, fazes os possíveis por explorar tudo o que ficou por conhecer. E fazes muito bem!
Bjs e volta sempre.
Cara Senhora
ResponderEliminarGostei da sua narrativa da viagem mas se me permite gostaria de lhe dizer que o Aerovacas que a Srªse refere ficava situado na Ilha de S.Miguel,porque nessa data o aeroporto internacioal de Santa Maria tinha muitos avioes,tais comoos da PANAMERICA,TAP,TWA,AERONAVES DO MEXICO,Air France,mais tarde com o CONCORDE e muitos mais.Cumprimentos e votos de Feliz Ano de 2010 com muitas viagens e se vier a Santa Maria como o nosso´tem uma pista enorme,3850m José
Caro José
ResponderEliminarEstive a rever as minhas fotografias da época e ía jurar que o aerovacas era mesmo em Sta. Maria, e já era muito bom, porque, como sabe melhor do que eu, na maioria das ilhas nem um porto para navios de maior porte existia. Mas já passaram muitos anos e admito que a memória me pode ter pregado alguma partida. Se assim foi, peço que me desculpe.
Eu já voltei aos Açores e sei bem como tudo está diferente. Quis fazer, mais do que um relato seco, um depoimento de impressões de uma viagem que me marcou bastante. Mas tudo o que escrevi, acredite, foi com um grande respeito e um enorme carinho.
Um abraço, e desejos de um bom ano.
Volte sempre.
Muito bem,cada um está sugeito a enganar-se.Sabe naquela altura havia 2 aeroportos internacionais: Santa Maria E Lages sendo este ultimo praticamente reservado a aviação militar.O de Santa Maria era o Aeroporto Internacional e reservado para as Escalas Comerciais,S.Miguel tinha,o tal Aerovacas e talvez já o Faial tivesse o seu,mas não sei ao certo.Prestado o esclarecimento e reposta a verdade espero que um dia a possa encontrar em Santa Maria.Bom Ano de 2010,José
ResponderEliminarDESCULPA NÃO TE TER LIDO...MAS REPAREI NAS FOTOS DOS AÇORES...E GOSTEI ....PORQUE ANDO PARA IR ATÉ LÁ... VAMOS LÁ VER...
ResponderEliminarOla, tenho 16 anos, e vivo nesse jardim de s.jorge, ainda existe mas penso que nada como antigamente concerteza.
ResponderEliminarOlá Diogo
ResponderEliminarPois, eu também acho que São Jorge deve estar muito diferente. Mas,mesmo nessa altura, era já uma ilha muito bonita.